quinta-feira, 6 de abril de 2017

A PORTA ABERTA



("Êxodo" de Marc Chagall)



"Em Êxodo 32,14, por outro lado, a Versão Autorizada consegue tê-la (a tradução) absolutamente, o que é o mesmo que dizer escandalosamente, correcta: "E o Senhor arrependeu-se do mal que pensara fazer ao seu povo." Um Deus arrependido! O que significa que a porta para o diálogo, para a persuasão, permanece aberta mesmo quando, como na parábola de Kafka sobre a Lei, nós somos incapazes de compreender que assim é."
"Paixão intacta" (George Steiner)

Em Kafka, o homem que espera diante do guarda uma vida inteira para entrar no palácio descobre, na hora da morte, que a porta esteve sempre aberta.

Mas, como diz Steiner, o escândalo é absoluto. Que o temor do sagrado (ou de um simples guarda) nos impeça de ter acesso à justiça (ou à paz connosco mesmos).

Os Gregos habituaram-nos à flexibilidade dos deuses (mas não da Necessidade). Foram os Hebreus que nos deram um Jeová inacessível.

Mas esta passagem do Êxodo revela-nos uma fraqueza insuspeitada, quase a prova da imanência (um deus apenas humano). E descobrimos com isso um outro valor da liberdade, que já não tem origem na política.

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